VI. Táctica. Jogo de Cabeça.
A táctica é o patinho feio dos pilares, no sentido em que não é heróica. Os estrategas são da sombra, maquinalmente jogam xadrez com as presas e as condições meteorológicas, pesando a humidade contra o vento dominante, avaliando a temperatura sem esquecer a sensibilidades térmica. Detalhes e mais detalhes formam a seda da fina teia do encadeamento.
A táctica é inimiga da emoção, logo inimiga do herói romântico. É tudo menos emocionante conceber uma estratégia para realizar um bloco, em vez de emotivamente saltar para arena, cair nas garras do bicho, e lutar cara a cara até cair para o lado. A consciência faz de nós cobardes, dizia Hamlet, também ele um táctico que se martiriza constantemente por ser incapaz de reagir a quente.
Feita a diabolização da táctica vamos tentar ver porque precisamos dela ou melhor como nos podemos servir dela sem comprometer o herói que existe em cada um de nós.
Jamie Emerson no seu excelente B3, a propósito da famosa passagem de Dai Koyamada pela Suíça no Outono passado, escreveu esta frase lapidar: “Should he climb Big Paw it is clearly not just an achievement of the body, but one of a well working brain”. E isto diz muito e quase tudo, aplicar o pensamento lógico é geralmente uma coisa que nos distingue dos nossos congéneres amigos animais e, na escalada, aplicar a reflexão lógia na prática faz com que nos distingamos dos nossos primos macacos. Portanto, se temos à disposição um cérebro podemos e devemos faze-lo trabalhar a favor dos nossos encadeamentos. Os resultados podem ser surpreendentes.
À medida que as pedras vão crescendo a táctica vai assumindo mais protagonismo, algo válido do lowball Diz Não à Droga na Pedra do Urso até ao Everest, a maior de todas as pedras. Porque simplesmente aumenta o perigo e esse no bloco aumenta exponencialmente à medida que os metros aumentam até se entrar na difusa fronteira do solo integral.
Como podemos minimizar tacticamente o perigo potencial?
Primeiro arranjar um segurador de confiança e experiente, alguém que esteja de facto centrado no escalador e não a aprender os movimentos ou a ver as vistas de mãos nos bolsos. Ter um grupo de companheiros motivados, não na competição mas na segurança e no sucesso dos outros, é algo raro e potenciador de energia. Algo de que todos irão beneficiar, pois este é um jogo em que os papéis alternam constantemente.
Não hesitar em usar todas as crash’s disponíveis, sem cair no facilitismo de pensar que por haver uma “cama de cras’s” o perigo desapareceu. Tendo ainda especial atenção com os desníveis buracos entre crash’s.
Analisar os ângulos de queda potencial para colocar as crash’s e se for preciso usar o conhecido truque de atirar a pedrita do cimo do bloco para determinar a zona de queda.
Antes de ir a um bloco alto é necessário analisar como descer dele, sabemos que no topo é mais fácil e evidente descobrir como se desce como também é fácil descobrir que não dá para baixar, por isso é bom precavermos o assunto e evitar situações, no mínimo embaraçosas, tendo algum material de escalagem na bagageira da viatura.
Tudo visto, tudo medido, a partir de certo ponto é sempre melhor não cair e aí cada um tem de saber até onde pode ir, até onde pode esticar a sua habilidade. A ideia de pensar antes de agir serve, em última análise, para garantirmos uma certa longevidade saudável e com algum sucesso também no nosso jogo preferido, que é o que interessa no fim das contas.
Quem quiser saber ou recordar mais pormenores tácticos, ver em Artigos o artigo Dai o Táctico, onde exploramos, através da actuação deste brilhante escalador, uma série de pormenores que podem fazer a diferença.
Não posso deixar de agradecer para este vídeo em particular o trabalho de câmara de Pedro Rodrigues assim como a segurança activa, exactamente um exemplo daquilo que foi dito atrás. SM
Bravo! Finalmente uma referência vídeo a essa nobre actividade desportiva que é o rappel!
Sim, o rappel já merecia aparecer em destaque, apesar de ser um rappel muito simples, um rappel táctico… para a próxima tentaremos incluir algo mais espectacular como o famoso rappel australiano ou mesmo o terrorífico rappel suspenso e se houver um voluntário o clássico rappel em S.
…a propósito, ouvi rumores de que o próximo calendário da Boldrini seria dedicado ao rappel em S. Veremos…
Muito bom este bloco. Pena o super CS ainda não ter tombado, mas o problema tinha de fazer jus ao nome. Pode ser que algum gajo de mota que por lá passe roube a FA daquilo. Oxalá que sim.
E já agora, muito bom texto. No jogo de cabeça, fazes lembrar o Gomes, és um autêntico bi-bota.